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A Balada do Soldado (Ballada o soldate - Grigoriy Chukhray, 1959)





“Ele poderia ter se tornado um homem notável.

Ele poderia ter sido arquiteto ou embelezado o país com jardins.

Ele foi... E em nossa memória sempre permanecerá, um soldado...”


Logo no primeiro plano de A Balada do Soldado contemplamos uma mãe fitar o horizonte vazio por uma estrada de terra e somos alertados: A mãe está à espera do filho que não retornará, pois morreu na guerra, longe dali, enterrado em terra distante. Esse preâmbulo torna a jornada de Alyosha, que observamos durante o transcorrer do filme, mais comovente.


Durante a Segunda Grande Guerra o soldado de 19 anos Alyosha – ainda nos planos iniciais do filme – por mais acaso do que bravura ou habilidade, aniquila dois tanques inimigos e seu general diz que o indicará para receber uma condecoração. Alyosha, sem hesitar interpela se é possível visitar sua mãe em vez de receber a condecoração. Alguns pontos do filme reforçam a natureza de Alyosha, mas esse breve diálogo é preciso em elucidar a essência do jovem soldado. Daí em diante observamos a jornada do jovem ao encontro da mãe. O cerne do filme é a jornada e não o destino.


No primeiro ato de sua longa jornada o jovem soldado acompanha um veterano aleijado no seu retorno ao lar, e tão logo Alyosha reconduz o veterano ao encontro da esposa, o jovem soldado sai de prontidão sem obter o agradecimento do veterano e sua esposa. Sua missão estava cumprida, a gratidão verbalizada não é compulsória nem necessária para nutrir o ego e índole pura do jovem soldado e, assim, ele retorna a sua longa jornada.


No segundo ato e que traz os momentos mais belos do filme, o jovem soldado tem o descobrimento do sentimento de amizade que rapidamente se converte em amor ao se deparar com a jovem Shura. No segundo ato parece haver os únicos momentos de juízo de valores e princípios quando o jovem soldado vai entregar o sabão para a esposa de um colega ou quando deixa a fúria tirar o melhor de si ao ser confrontado por um soldado corrupto. Isto posto, talvez o grande êxito do filme é, em tempos completamente devastadores, não digressionar ao cinismo ou existencialismo, mas sim o egresso a temas ou pregações políticas, e ressaltar a humanidade e altruísmo em sua essência mais autêntica. Exemplo disso é quando Alyosha e Shura viajam no trem com a porta aberta e divagam sobre amor e amizade em meio a paisagem assolada pela guerra. A simetria e rigor técnico dos enquadramentos expressam uma sensibilidade poética singular e são tão precisos que, por vezes, assemelham-se a grandes pinturas que quando combinadas a música, transformam-se nas mais lindas sinfonias.


No terceiro e derradeiro ato, o jovem soldado encontra a mãe, mas após a longa jornada, com seus sabores e dissabores, restou tempo para apenas um abraço na querida mãe. Momento este o mais terno do filme que, compreendendo o que foi dito nas primeiras palavras do filme, expande imensamente o teor melancólico da cena.


A Balada do Soldado é, essencialmente, um filme despido de ideologias políticas e sobre humanidade que exprime o quão precioso é o breve tempo que temos para experimentar as alegrias da vida. Mas igualmente de profunda tristeza, pois nos mostra o que poderia ser da vida de um indivíduo se não fosse a guerra. Ele poderia ser um homem notável, embelezado o país com jardins, vivenciar o amor, amizade e fraternidade, mas foi simplesmente um soldado, morto como milhões antes de realizarem seus sonhos. Apesar de toda sua humanidade e tenacidade, o jovem soldado não teve o mesmo destino de Ulisses em sua Odisseia.




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